Sobre Dão Carvalho e seus textos..

      Minha mãe fala que eu dô trabalho pra ela desde qui nasci..comenta até hoje que quase morri, nasci prematuramente de 8 meses, desnutrido..e fiquei 1 mes numa encubadora..quando criança tinha problema de boqueira e mijei na cama até os 12 anos de idade, até minha mãe me levar numa senhora benzedeira..acho que em vez de me benzer a filha da puta me amaldiçoou..! depois disso foram várias aporrinhações subsequentes..na escola, na quebrada, na vida..mas aprendi algumas coisas também..conheci as ruas e com ela conheci a musica...estudei um pouco dela, mas num parei por ai não. Vivi um bom tempo da minha vida andando de lá pra cá, viajando pelo Brasil fazendo pesquisa de campo prum instituto de pesquisa,faziam levantamentos sociais, isso pelas bibocas mais vulneráveis dos quatro cantos..percorri algumas fronteiras do Brasil presenciando a olho nú situações lamentáveis capaz de fazer qualquer um chorar..e num foi diferente não, chorei muito..ao mesmo tempo viajava tb em meu imaginário..pesquisei culturas populares e aprendi fabricar alguns instrumentos..mas nada valeu tanto como conhecer a garota mais linda da minha vida..Olivia..minha filha que modestias a parte, uma criança de beleza farta!
     Desde então venho sendo perseguido pelo espirito de um escritor que me perturba a todo momento..Plinio Marcos não me deixa em paz, por isso, resolvi fazer da arte de escrever contos marginais meu mais novo desafio!Eu?..um som reverberado da cidade!
Dão Carvalho

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 Alguns textos de Dão Carvalho
 
Transex
por Dão Carvalho

Nóis transex sofremos preconceito demais moço..a gente já num guenta mais tanta humilhação, esses desgraçados vem aqui, xinga a gente, qué passa a mão de graça, esculhamba com a gente e o senhor qué que a gente faça o quê?
― Mas também num precisava fazer isso né. Foi você?
― Eu moço?..eu nem tava aqui! Vim correndo quando vi a Michely gritando..
― Num precisava...num precisava..!! - resmunga Michely - esse demônio tá já é hora enchendo o saco da gente seu policial, já dei cinco cigarro pra ele, ele já mostrô as parte de baixo três vezes pra mim..
― Foi quem então? Indaga um dos policiais.
Todas ficam em silêncio exercendo o código de ética usado por elas na madrugada
― Vô fazer o seguinte então, vô chamar outra viatura e vô levá todo mundo pro distrito.
― Todo mundo não..!.- desabafa Michely - caraio..sifudê! Tô trabalhando porra! Já passei duas noite dessa semana no xilindró por causa daquele bêbado da rua Augusta..pro 2ºdp eu num volto.
― Então..quem fez isso com o rapaz? Perguntou novamente o milico.
Lorena disfarça com Steffany na esquina da Haddoc Lobo e em seguida descem para rua Augusta pela Antônio Carlos..
Íris continuava andando de lá pra cá..feito barata tonta reclamando:
― Só porque a gente é travesti, deve ser por isso meu Deus..
O policial investiu novamente..
― Hô filha!..quero dizêr,..moça! Quem fez isso com a vítima? Foram vocês?
― Mais moço...o senhor queria que a gente fizesse o quê? Ele tava perturbando todo mundo aqui..pode perguntar pra Cici..Num foi Cici?
Cici balançou a cabeça em sinal de positivo.
― Foi uma só ou foram todas juntas?
Todas permaneceram em silêncio..menos Íris que não parava de reclamar.
O dia já estava amanhecendo e enquanto a abordagem não terminava pessoas passavam voltando da balada..viam o furdúncio e aproveitavam para zombar..
― Olha os traveco vestido de policia..Tá quanto o programa? Hahaha!
Carolyne no quétinho foi raspando o gato, Íris tirou um sal de frutas da bolsa e enfiou na boca a seco...misturou com a saliva e em cinco minutos estava espumando pela boca..Bruna e Brenda fingiram socorrê-la, diziam que ela dava esses ataques de epilepsia toda vez que ficava nervosa..gritavam..
― Caraio Íris...acorda porra..! Meu Deus do céu..minha amiga tá tendo um ataque! Tá vendo aí seu moço..ela tem problema..
Na intenção de amenizar o trabalho o soldado Dias murmura:
― Some com sua amiga daqui..rápido vai..
Bruna e Brenda levantam Íris com todas suas forças, a miserável media 1,90m, e após uns três ou quatro metros Íris já corria com suas próprias pernas..eram todas treinadas em situações de perigo.
Um dos soldados olha pra os lados e em meio a zé povinho e o dia amanhecendo percebem que já não há nenhuma das transexuais ali..
― Porra Macedo!...o que eu faço agora caralho?
― Bate um radio pro tenente!
Soldado Dias caminha até o radio na viatura e da sinal a base..
― QAP operante, soldado Dias no QRU nas imediações da Haddoc Lobo tenente..
QAP prossiga soldado..
― Tenente estamos num QRU onde houve vítima que sofreu agressão por parte de transexuais que trabalham nas imediações da rua Haddoc Lobo mas todas elas conseguiram se evadir senhor, de que forma devo proceder tenente?
Porra soldado..são seis hora da manhã caralho..se qué que eu faça o quê? Libera a vitima porra! se ele quiser vai pro distrito e faz um boletim de ocorrência.
― Positivo tenente..
Dias andou em direção a Macedo dizendo:
― Vamos ter que liberar a vitima Macedo..vai..eu desamarro os braços e procuro as roupas..você arranca esse vibrador do rabo dele e pergunta se ele quer fazer um B.O..
― Caralho!..eu fico sempre com a pior parte! 



O dia não era de Romulo!
Por: Dão carvalho



Parou inesperadamente o eco sport preto de vidros filmados..a esquina era a da Brigadeiro com a Jaceguai, nos entornos do imperio Silvio Santos...baixou o vidro do passageiro surpreendendo Romulo.
A Consolação filho..como chego na Consolação? A senhora do carro não fez questão ao menos de sair de tras de seus oculos escuros de grife.
A Consolação senhora?...a senhora entrou errado, tinha que ter pego o viaduto, sentido centro, - disse Romulo simpaticamente - tente contornar o quarteirão, sair na brigadeiro denovo e pegar o viaduto. O vidro filmado começou a subir...desceu novamente o vidro..
E só pegar o viaduto? perguntou a senhora.
É,..pega e vai direto..
O vidro começoua subir e Romulo zangou-se.
Porra madame, a senhora quer a informação ou está com medo de ser roubada?
A senhora fez cara de indiferente e nada falou, baixou o vidro mais um palmo e repetiu o dito..
Contorno o quarteirão e pego o viaduto? subiu o vidro uns cinco centimetros...claro sem dizer obrigado.
Quer saber senhora....Vá a merda! esbaforiu Romulo. Policiais da base da PM em frente o teatro imprensa perceberam a agitação e chegaram de armas na mão.
Deita no chão garoto!
Romulo deitou-se de bruços..
Mas é qui...!
Deita no chão e fica quieto! falando pelos cotovelos só vai se complicar mais.
Um grupo de zé povinho agora rodeavam Romulo deitado ao chão como se fosse a atração do dia..
O que aconteceu senhora? perguntou o milico.
Fui falar educadamente com ele, pedir uma informação e ele ficou todo nervosinho...todo descontrolado..
É isso mesmo rapaz?
Tava dando a informação pra ela senhor e ela..
Cala a boca! - disse o policial, - que informação senhora?
A consolação...preciso chegar na consolação!
Mas a senhora entrou errado...tinha que ter pego o viaduto senhora..tenta contornar o quarteirão e pegar o viaduto direto!
Agora entendi sr. policial..obrigado e bom dia!
Por nada senhora, comentou o policial olhando para Romulo e dizendo: ..e você fica quietinho ai seu ladrãozinho de merda..já, já a gente conversa!



3em1
Por Dão Carvalho


Zona leste, bar do seu Jorge..o radio toca um clássico do originais do samba..

Na subida do morro é diferente...o movimento é geral,.o movimento é diferente, no sobe, desce, sobe gente, o cumprimento é diferente..alô como vai?..comé qui é? Alô como vai comé qui é?..

O volume do 3 em 1 de seu jorge está relativamente alto, e como se já não bastasse o volume, seu Jorge completava cantando com veemência.

Alô como vai coméquié!!
Porra seu Jorge..! Abaixa um pouco esse radio ai...! Eu e o Anselmo tâmo tentando conversá aqui!

Seu Jorge era ignorante..

Porra!...conversa aí..! deixa eu cantar minha musica caralho!
O 3em1 chia..
Seu Jorge chega perto da antena..
O 3em1 toca..
O som continuava alto, seu Jorge continuava cantando...mal conseguiam brigar direito..

Porra seu Jorge..desse jeito cliente nenhum vai querer entrar no seu bar!
Ué?..e se num tá aqui? Chia seu jorge..
Tô seu Jorge, e o senhor devia agradecer por a gente ainda vir beber aqui no seu bar..
Hã..! Me engana que eu gosto! Pensa que não vi vocês indo em direção ao bar do Costa? Só num ficaram lá porque tava fechado! Porque o Costa num é trouxa e num tem que ficar agüentando vocês até no domingo!
Mas já que o senhor abriu, trata a gente com mais zelo meu querido..somos seus clientes..
Num tô falando nada! Quem tá reclamando são vocês! - retrucou seu Jorge..
Tamo no direito seu Jorge, só queremos um pouco de sossego!
Qué sossego?...vai pescá! Aqui num é lugar de sossego! Teimava seu Jorge..
Anselmo já colocava a mão no peito de “Fumaça”..que mesmo com total descrição em sua carreira no crime, já estava a caminho de perder a linha com o dono do boteco..
Anselmo tava no “deixa disso”..”deixa quéto”.. mas seu Jorge continuava a cantar,
Na subida do morro é diferente...!

O balconista não via o porquê de ter que abaixar o volume do 3 em 1..
Fumaça caminhou,..dessa vez irritado em direção ao balcão de seu Jorge..pois achou que o velho passara dos limites..
Seu Jorge..seu Jorge..
Calma!..dizia Anselmo tentando segurar Fumaça pelo antebraço..
Calma o caralho...seu Jorge...desliga essa porra! Gritava fumaça do fundo da expelunca..
Num vô desligá nada...se quiser ficar aqui, toma sua pinga ai e cala a boca!
Fumaça fez o que Anselmo temia e o que seu Jorge não esperava..puxou por debaixo do moleton vinho a pistola 380 que escondia na sinta, ameaçou de atirar no 3 em 1 mas seu Jorge entrou na frente, não podia deixar que fizesse isso, afinal comprara em um crediário muitos anos atrás em 24 suaves prestações nas casas Bahia..
Seu Jorge amanheceu jogado por cima do balcão com dois tiros no peito.. o 3em1 ainda estava tocando.
 

 


Férias d'escola
Por: Dão Carvalho
Dei um nó no saquinho do gelinho..estourei..olhei pro céu como um monitor de voô..
O araújo flutuava lentamente num vento pós chuva..de certo, o vento tinha estourado a linha - que fosse dez..que fosse corrente - e o pipa já não tinha mais dono..coloquei a lata de azeite com dois carretéis dos grande encaixada embaixo do suvaco dando início a corrida..o vento levava o pipa em direção ao morro, pra trás do campo. Corri em direção ao campo e agora o araujo amarelo de orelhinhas roxas flutuava como se desse sinal de aterrizagem...a correia do meu havaiana's estourou..ranquei as chinelas dos pés e os coloquei nos antebraços por entre a borracha..esbaforido gritei..
Ninguem cóla hein...o baguio tá na mão! os moleques rodeavam o campo levantando poeira, levantando um talco vermelho que só os campos de várzea tem..gritavam o mesmo que eu..Enquanto gritavam pude ver a uns dez metros da roda a linha que arrastava pelo chão..me desloquei do centro em direção da linha..agarrei..puxei..Celinho grudou a rabiola dizendo...- Tá na mão!..Eu ja puxara a linha sinalizando a todos que havia sido mais rápido..
Caraio Quincas..joga na mão pra mim soltá? - disse Celinho
Não! comentei rispidamente com um sorrizinho no canto da boca já desembaraçando a rabiola da linha..
O Gordinho veio correndo dizendo..
É pra coleção Quincas?
Sorri..tirei 2 cruzeiros do bolso da bermuda dizendo pro Gordinho..
Busca dois gelinho na dona Dita...o meu é de goiaba hein! 
 

Presente de grego
por Dão Carvalho


..é nóis, Queiroz..!

Salve o corinthians, o campeão dos campeões, eternamente....
Porra! lá vem questa turma de desocupado, ô povinho chato é corinthiano..adora una bagunça, falar alto, são forgado, não tem a menor educacione! – comentou Genaro com seu Ferreira que fazia o jogo do bicho. Seu Genaro, apesar de italiano, torcedor do juventus, e morador da Mooca ainda achava isso um absurdo,..não se conformava com gritarias, mas tinha que agüentar, aqueles eram seus melhores clientes, e seu boteco, um dos poucos que sobrara na pacata rua Taquari no bairro da Mooca. Seu Genaro morava a uns trinta anos naquela rua, morador antigo, procurava preservar a construção mantendo a casa nos fundos, e um grande terreno à frente ainda de chão batido, onde criava algumas galinhas e por mais incrível que se imagine, uma família de cabritos,...uns oito aproximadamente.
Todos adoravam perturbar Genaro, principalmente os corinthianos, dizer que o juventus iria jogar num campinho de várzea lá na Vila Califórnia, se ele iria, quando ele daria um de seus cabritos pra um belo churrasco, e o que mais irritava seu Genaro, chamá-lo de muquirana. Disso ninguém tinha dúvidas, Genaro era avarento,..daqueles que crianças iam com moedinhas faltando para o pirulito, e seu Genaro os mandavam voltar, dizia ressonando pelo papo: - Os pais fazem de propósito, além do mais, as criança tene que aprender a fazer conta desde pequeno – mas nada justificava a avareza de Genaro. Muitas vezes nem fazia de propósito, era natural pro italiano.
Já Lulinha e Gordão eram puro sarro, a vida desses dois corinthianos era só zoeira, trabalhavam na loja de materiais para construção de seus pais na rua da Mooca, e aos finais de semana, quando não tinha jogo, a encheção era lá no bar do italiano.
Lulinha o mais velho, gavião original, o agitador, quem levou Gordão pela primeira vez ao estádio. Gordão imagine, dezessete anos, cento e vinte e três quilos, não pegava garota alguma, a não ser nas visitas que faziam a casa da tia Olga, ou se preferir, na luz vermelha, ali mesmo na Mooca, conclusão: corinthiano! fora a dupla infernal, tinha uma equipe pra reforçar a zoeira, Lucas, Tavinho e Fabrício eram seus comparsas.
Seu Genaro, manda duas Brahmas bem gelada, seu Genaro que mau lhe pergunte, e os cabritos? – Disse Lulinha já com ar de deboche.
Vão bene!
A gente passa o ano inteiro aqui seu Genaro, gastando na sua bodega, - Lulinha já de sacanagem - tâmo perto do natal, já tá na hora de o senhor dar um cabrito de presente pra nóis né? sabe cumé seu Genaro, fim de ano, cervejinha, churrasco!
É isso aí seu Genaro, tô loco pra comer carne de bode! - disse Gordão que sempre se achava autoridade ao se pronunciar depois de Lulinha
Trata de ir tirando queste olho de mio cabrito!
ma os cabrito são meu xodó hã!
Orra seu genaro, tu é muquirana mesmo hein! – Disse Fabrício enchendo o copo da rapaziada e fazendo gozação.
Genaro, agora com os olhos vermelhos...
Ora ora, ma vá, si querem beber sem echeçon bene, si forem encher o pacová, vão beber nôstro lugar capitche?
Tá bom, tá bom seu Genaro, desce mais duas aí!
O italiano, com muita paciência, aturava o banzé até tarde, e só após baixar aquela porta de aço e todos irem pra casa, é que realmente se sentia aliviado. A rotina era a mesma a trinta anos, após trancar o bar, caminhava pela Taquari uns vinte metros até chegar em casa, tocava as galinhas, alisava os cabritos e em seguida, entrava pra dar um beijo em Conchita, sua companheira de longa data. Genaro, como sempre fazia carinho nos cabritos um por um, ao procurar barbicha, o cabrito mais velho e pai de toda família, percebeu que o velho animal se encontrava no canto do quintal deitado, em baixo das parreiras de dona Conchita, e ao mexer em barbicha, o que Genaro não esperava,...estava morto.
Dios do céu, Conchita, Conchita, o barbicha está morto caspita!
Conchita correu para o quintal com ar de desesperada...só então pôde perceber uma baba que saíra da boca de barbicha, Eugênia, visinha ao lado, gritou do muro que havia escutado uma tosse do animal durante a noite.
Ma i agora Conchita, o qui vamo fazê queste animal? só pode ser olho gordo daqüeles corinthiano – Genaro estava chateado.
Io non sei Genaro!
Ma vamo comê questa carne hã?
Genaro, mio bene, queste cabrito deve de ter morrido de doença, já ta mui velho, a carne já tá mui dura...tem mais, vamos passar o natal na casa dos filho, nossa geladeira non cabe questa carne mio velho...
Pode deixar, io já sei o que vou fazer. - Genaro estava decidido, daria o cabrito aos corinthianos, se livraria rápido do animal e acabaria de uma vez por todas com a encheção de anos daquela turma.
No dia seguinte ao abrir o humilde boteco, encontrou Tavinho, um dos chatos de galocha voltando da padaria com um saco de pãezinhos...
Garoto!
Ôo..falaí seu Genaro! que manda?
Avisa seus amigo, io tenho una carne de cabrito lá hã..aliás, um cabrito inteiro, ma vô passa as festa com mios filho i num tenho onde guardar tanta carne capitche?
Ô seu Genaro...claro que eu capitche! - replicou Tavinho com um sorriso no rosto.
Ma i num é pra acostumar hã..
Que isso seu Genaro,...muito obrigado, o Lulinha vai adorar saber disso,..mais tarde a gente passa pra pegar...
Tavinho estava saltitante, além da carne pro churrasco o que mais deixava ele feliz era a rendição do italiano.

no depósito da família de Lulinha..

Cê tá brincando Tavinho, se for zoeira se tá fudido!
Juro Lulinha! ele me gritou de longe quando saía da padaria,.disse até pra gente não acostumar e...
Mas logo seu Genaro,..o véio mais avarento que conheço!
Cê tá ligado Tavinho, isso vai servir pra calar nossa boca por um bom tempo, as zoeiras com o coroa..
Eu ouvi direito? – intrometeu-se Gordão passando o troco pro cliente – cêis tão falando que o véio Genaro deu um cabrito pra nóis?
Fica na moral aí Gordão!..na hora de assar o cordeiro a gente te chama.. – esculachou Lulinha olhando pra Tavinho e rindo, Gordão também riu.
Tavinho liga pro Lucas e fala pra ele passar de carro na casa do seu Genaro na hora do almoço pra não atrapalhar e pega esse cabrito. Olha,.agradece o véio.
Falô!
Tavinho ligou para Lucas que achou que fosse brincadeira, não acreditou no acontecido mas topou na hora..
Tavinho,..esse acontecimento é histórico, pega a bandeira, temos que esticá-la no carro.
Pode crê!
Passaram na casa do italiano, pegaram a carne, agradeceram até demais, deram feliz ano novo, feliz natal que já havia passado e foram embora gritando: Timão êo! timão êo! timão êo! timão êo!

no sábado seguinte, logo pela manhã...

Porra Fabrício! comer cê sabe né? ajuda o Lucas a tirar o carvão do carro! Vai Gordão,..vê se faz alguma coisa também, tó,..coloca essas breja na geladeira!
E você só dando ordem né Lulinha? – disse Gordão com cara de marra.
Tudo certo,..cervejinha gelando, e a tão sonhada carne de cabrito assando. Gritavam em coro: salve o corinthians, o verdadeiro campeão, o seu Genaro, agora é nosso amigão... e caíam na risada. Só zoeira, só curtição, Gordão se esbaldava na carne de cabrito de modo que nem falava..
Fala alguma coisa aí Gordão..- zoava Lulinha olhando pro resto da rapa e rindo.
Tudo muito engraçado, até a passagem inesperada pelo portão de Baianinho, cearense sem pescoço e da cabeça bem achatada, como os corinthianos, um sarrista, e o pior,..palmeirense.
Êaí monte de galinha preta! comemorando o que? a subida do timão?
Cê é cara de pau hein baianinho! – disse Fabrício.
E ainda corajoso – acrescentou Gordão.
Ôxe! Tava só brincando,..
Que cê qué aqui Baianinho? – perguntou Lulinha de uma forma um pouco áspera.
Nada não!
Tavinho,..- orientou Lulinha – de olho no cabrito pra não queimar!
Baianinho com um ar de deboche..
Há,..mas esse num é o cabrito do seu Genaro que teve um treco e bateu as bota semana passada?
Que?...bateu as botas?..treco? – gritou Tavinho lá da churrasqueira.
É, ou cêis num sabe que esse cabrito agonizô a noite toda antes de morrê?
Conta essa história direito baianinho..
Baianinho não podia perder aquela oportunidade de zoar com os corinthianos e então mandou:
Esse cabrito já tava mais véio que matusalém,..dona Efigênia, a visinha do Genaro, disse que esse cabrito tava soluçando quinêm cachorro já fazia uma semana, dava pra iscutá de dentro da cozinha dela num sabe, semana passada esse bode véio caiu duro no quintal espumando pela boca..
Véio filha da puta! – gritou Lucas antes mesmo que baianinho terminasse..
Continua baianinho..
Dona Efigênia disse que a espuma que saiu da boca e das venta do bode era azul num sabe! deve de sê alguma duença daquelas braba!
Aquele véio do caralho fez isso?
Ôxe! Dá nada não gavião, lá no norte a gente também faiz isso!
Baianinho, vaza daqui! – Gritou Lulinha
Gordão colocou a mão tapando a boca simulando uma ânsia, Fabrício que estava do lado o observou e disse:
Se vomitar em cima de mim eu te mato monte de banha!
Eu sabia, eu sabia! – gritava Tavinho.
Aquele véio não perde por esperar, italiano filha da puta, presente de grego, deu um cadáver pra gente comer, e pior, num sabe nem de que doença o miserável do cabrito morreu, tá fudido, vô armar uma prêsse muquirana desgraçado! – Lulinha estava com os nervos a flor da pele e Gordão,..hã!..vomitando pelos buraco do nariz.
Eu vô fazer alguma coisa antes que a raiva vá embora, e vai ser agora! murmurou Lulinha com fumaça saindo pelas orelhas, sentiu vontade de vomitar também, deu ânsia, mas a raiva era maior.
Mas o que se vai fazer Lulinha?
Lucas, liga o carro e me leva no cemitério! Agora!
que cemitério Lulinha? o quarta parada?
Vai logo porra!
Calma aí gavião..
Rumaram em direção ao cemitério da quarta parada, que ficava a alguns minutos dali..
Pega aquela rua atrás do cemitério Lucas..
Aquela onde o pessoal vem fazê as macumba?
O que se vai aprontar Lulinha? qué dizê, nóis?
Cê vai vê!
Para aqui Lucas,..nessas macumba..aquele véio desgraçado num gosta de dar difunto pros outros comê? tá fudido, vô dar o troco. Lucas,..pega aquela galinha que eu pego essa aqui..bate ela pra tirar a farofa.
Da macumba Lulinha?
Tá vendo outra aqui?
Eu num vô pegar essa porra não!
Larga de ser cuzão Lucas, num dá nada!
E vai por essas merda no porta malas do meu carro?
Larga mão de ser enjoado, a gente forra com um saco de lixo..
Com a mão esquerda e o maior receio, pegaram duas galinhas pretas sacrificadas. Tudo calculado, tiraram as penas e assaram do jeito que havia sido encontrada, inclusive com as víceras e miúdos. marcaram pro dia seguinte. Tudo sob o comando de Lulinha..
Aí Gordão, cê que vai entregar esses frangos pro rôla mucha do Genaro!
Porra logo eu?
É, vai falar que foi o pai que mandou e...

no bar de seu Genaro..

Fala seu Genaro!
Fala Gorduchone..
Meu apelido é Gordão seu Genaro, num tem nada de duchone não! – Gordão era marrudo. – vim fazê um agrado,..meu pai esperimentô do cabrito, adorô,..trouxe umas galinha caipira lá do sítio, mandou minha mãe assar e eu trazer pro senhor e pra dona Conchita pra retribuir..
Seu Genaro sem confiança alguma..
Má io fico lisonjeado garoto! avisa tu padre pra i no bar pra conversamo hã! agradece ele filho..
Tá bom seu Genaro, deixa eu ir trabalhar!

na loja com Lulinha...

Pronto Lulinha..entrega feita..tomara que aquele veio do caralho encha o rabo de galinha podre...Há há! – os corinthianos riem e se dão por vingados..

na casa de Genaro... após tocar as galinhas e alisar os cabritos..
Má Conchita mia veia, tu num me acredita o qui mi aconteceu hoje, um dos corintiano qui eu dei o cabrito foi lá no bar me agradecê e levá esses frango, falô que é como agradecimento, qui o pai deles que esperimentô a carne do barbicha, qui gosto, i mando as galinha.
Má véio, vê na geladeira o tanto de comida que sobrô da ceia de natal, temo que desfazê um pouco desta comida! Aqui é só io i você mio véio!
Má io também num confio naqueles corintiano, dá eles pra Efigênia, aproveita i dá também essa champanhe qui a gente num bébe.

no dia seguinte..

Bom dia dona Efigênia! –disse Baianinho – Feliz ano novo pra senhora!
Bom dia menino.. pra você também filho! Baianinho vem cá! sobrô muita coisa aí da ceia, cê sabe, povo exagerado, cê num qué levar uns frango assado que tem aí?
Ô dona Efigênia, Deus abençoe, eu aceito sim e agradeço!
Cê tem bastante irmão né?
Sete!
É,..tem dois frangos aí,..Deus abençoe, e feliz ano novo pra todos vocês tá? – com um jeitinho de simpática, dona Efigênia deu novo destino aos frangos..
Pra senhora também dona Efigênia, muito obrigado! - Baianinho seguiu a rua em direção sua casa num curtiçinho na Taquari de cabeça baixa pensando, tava contente pois os frangos estavam com uma cara ótima, seria “o” almoço,...quase bateu de testa com Fabrício..
Êaí Baianinho,..indo pra onde quessa pressa?
Ôxe! Pra casa,..porquê?
Cê fez a gente pagar mó congesta na frente de todo mundo né?
Eu?
Seu palmeirense de merda, é, você mesmo! foi lá esculachar nosso churrasco! agora é você que ta na dívida de uma presença pra nóis tá entendendo? – acelerando Baianinho - Tô indo ali toma uma gelada com a rapaziada, Lulinha, Gordão, tem uns gavião pra chegar, o que tem pra nóis aí?
Tenho esses frango aqui..Leva eles! fala pra rapaziada que fui eu que mandei..- Baianinho achou melhor sacrificar o almoço à levar um cacete.
Da essa porra aqui então!...papagaio assado com cerveja é melhor ainda! A rapa vai gostar,...Baianinho,...Vasa!!
Baianinho, agora decepcionado, continuou seu caminho pra casa, perdera os frangos e tinha que aceitar,..essa ele tinha perdido. – Ou não?
Chegou Fabrício a padaria onde todos os corinthianos bebiam enchendo o peito e dizendo..
Trouxe uns frango assado pra nóis quebra com a cerveja,... aí Alaô,..corta pra nóis num prato faz favor – escalou o atendente.
É pra já patrão!
Come aí Gordão,..aí Lulinha..demorô! – Fabrício todo cheio.
Num é a toa que esse mano é corinthiano! – disse Gordão..
Já te disse, vai na minha Gordão, vai na minha que se passa de ano! Todos riram!